Marcelo Gigliotti, Jornal do Brasil - JB on line 25/03/2010
Quem mora no Rio de Janeiro convive com ela todo dia. Cobrindo os maciços, adornando o Corcovado, marcando presença e enchendo de vida toda a cidade. Porém, a Mata Atlântica, um dos ecossistemas mais ricos em biodiversidade do planeta, e uma dádiva para o carioca, perdeu 89% por cento de sua cobertura original. Mesmo no Rio, são poucos os remanescentes virgens desta riqueza, uma vez que boa parte dela, como a Floresta da Tijuca, foi devastada e depois reflorestada. Esta situação levou cerca de 200 cientistas de todo o país a se mobilizarem para sua preservação. E o primeiro passo foi dado com a elaboração de um censo das espécies vegetais, o livro Plantas da Floresta Atlântica.
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Nada menos do que 15.782 espécies vegetais foram catalogadas no livro, um trabalho pioneiro, que reuniu informações que estavam dispersas em diversas instituições científicas. Este volume de plantas representa 5% da flora mundial.
– Um dos aspetos importantes deste levantamento é a constatação que 45% das espécies listadas (7.155) são endêmicas, isto é, só ocorrem na Mata Atlântica. Isto mostra a nossa responsabilidade com a própria humanidade em preservar este ecossistema – diz um dos editores do livro, o pesquisador João Renato Stehmann, da Universidade Federal de Minas Gerais, que junto com o Jardim Botânico do Rio produziu a obra.
Segundo ele, a Mata Atlântica é um dos cinco hotspots do mundo. O termo indica ecossistemas que concentram mais espécies endêmicas e que tiveram mais de 75% de sua área devastada.
– É um conceito que une biodiversidade, endemismo e ameaça de extinção – explica o pesquisador.
Os hotspots são considerados áreas prioritária para conservação, ecossistemas que precisam ser estudados o quanto antes pela sua fragilidade.
– Para esta preservação, há três etapas. A primeira é conhecer quais espécies ocorrem. A segunda é avaliar o estado de conservação e a quantidade delas. E a terceira é traçar metas para diminuir o grau de ameaça – diz o cientista.
E este esforço é uma corrida contra o tempo. A Mata Atlântica surpreende os próprios cientistas. A cada semana, uma nova espécie é descoberta. Além disso, determinadas espécies ocorrem em locais restritos. Ou seja, podem sumir com a ocupação urbana, ou com o desmate para outro fim, sem que sejam sequer conhecidas pela ciência.
Nesta luta pela natureza, há outras frentes de combate. Uma delas é fazer o governo federal declarar as espécies como ameaçadas de extinção. Com este status oficial, elas ficam sob proteção da lei.
– A comunidade científica tem feito pressão para que a lista de espécies ameaçadas seja ampliada. Hoje, oficialmente, há 238 espécies ameaçadas. Mas, para os cientistas, o número chega a 727. E o pior é que a lista oficial se baseia em dados de 2005. De lá para cá, 300 espécies foram descobertas – diz o pesquisador.
Com o livro Plantas da Floresta Atlântica, um calhamaço de 516 páginas, os cientistas esperam dar informações preciosas para os trabalhos de reflorestamento.
– A ciência pode orientar na produção de mudas; na escolha de espécies para reflorestamento adequadas para cada área; e também na indicação de locais para replantio – diz João Renato.
Se a Mata Atlântica, junto com o ser humano, vai superar estes desafios, só o tempo dirá. Segundo o pesquisador, áreas que já foram degradadas levarão pelo menos 300 anos para serem reconstituídas em sua plenitude. Espera-se que as futuras gerações colham estes frutos.
Brasil lidera desmatamento
Relatório de Avaliação Global de Recursos Florestais 2010, da Organização das Nações Unidas (ONU), divulgado quinta-feira, mostra que o Brasil, apesar de ter diminuído a área desmatada, continua em primeiro lugar no ranking do desmatamento no mundo.
Entre 1990 e 2000, houve uma redução significativa na perda de florestas brasileiras. Na última década, o país passou de 2,9 milhões de hectares anuais desmatados para 2,6 milhões nos anos 2000, segundo a ONU.
No mundo, nos últimos dez anos, 13 milhões de hectares anuais de florestas nativas foram transformadas em terras agrícolas ou destruídas por causas naturais, o que mostra uma redução em relação à década de 1990 quando foi registrada uma perda de 16 milhões de hectares.
A América do Sul e a África tiveram as maiores perdas anuais de áreas verdes no período entre 2000 e 2010, registrando 4 e 3,4 milhões de hectares, respectivamente. A Oceania também teve uma grande perda de florestas, mas por um motivo bem diferente, devido à grande seca que atinge a Austrália desde 2000.
Por outro lado, a Ásia ganhou 2,2 milhões de hectares ao ano na última década em função das ações de reflorestamentamento em grande escala na China, Índia e no Vietnã, aumentando sua superfície florestal em cerca de 4 milhões de hectares anuais nos últimos cinco anos.
Nos Estados Unidos e na América Central, a superfície florestal permaneceu estável. Na Europa, houve crescimento da área verde.
– Os países devem intensificar seus esforços para melhorar a conservação – disse o diretor-geral adjunto do departamento florestal da FAO, Eduardo Rojas. (Das agências)